Numa cidade cheia de sirenes e motores, é preciso fazer um grande esforço para se pensar na tranquilidade que devia ser quando estes e outros ruídos ainda não existiam. No centro do Rio de Janeiro, como havia, e ainda há, muitas igrejas, o auxílio dos sinos era fundamental. Eram eles que indicavam aos bombeiros o lugar exato do fogo, além de casamentos, enterros e outros eventos importantes. E indicavam também, como no caso do temido "toque do Aragão", a hora de se recolher.
O desembargador Francisco Alberto Teixeira de Aragão era o Intendente Geral (uma espécie de prefeito) em 1825, quando através de um edital foi determinado que os sinos das igrejas de São Francisco de Paula e do Mosteiro de São Bento tocariam durante meia hora, às 10 da noite, no verão, e às nove, no inverno, para alertar as pessoas de que ninguém deveria sair de casa até o amanhecer. Quem saísse seria revistado e poderia ser preso. Tudo para diminuir os casos de roubos e arruaças, bem menores do que hoje, porém já significativos para a época. Entre os principais arruaceiros, estavam os capoeiras, geralmente escravos fugidos que saíam em bandos para atacar as pessoas, ou mesmo a polícia, com seus "rabos de arraia" e outros golpes.
Os sinos já anunciavam os incêndios desde o início do século XVII. Se ocorresse à noite, no centro comercial da cidade, por exemplo, ele era avisado pela Igreja de São Francisco de Paula. Os sineiros também ganhavam dinheiro para anunciar o nascimento dos filhos de pessoas importantes. Se fosse do sexo masculino, eram nove badaladas, se fosse menina, davam sete toques. "Cidade de frequentes festas religiosas e procissões quase diárias, com foguetes e espocos e sinos a repicar, o velho Rio de Janeiro exteriorizava na música alegre dos sinos a alma simples e boa do seu povo" (Crônicas da cidade do Rio de Janeiro, Noronha Santos).
Outro aspecto dos incêndios que merece ser citado é o que ocorria quando os bombeiros partiam para apagar o fogo - sem sirenes, é claro. Se fosse à noite, os donos das casas que ficavam no caminho tinham de colocar lampiões na entrada para iluminar o trajeto, mesmo que precariamente. Quem não fizesse isso, corria o risco de ser punido. Os lampiões eram acesos, em sua maior parte, com o óleo extraído das baleias que infestavam a Baía de Guanabara. Antes de 1854, quando a iluminação a gás fez com que o Rio de Janeiro deixasse de ser uma cidade de sombras, o óleo de baleia era de fato o principal combustível dos lampiões e dos oratórios que ficavam nas esquinas.
As baleias foram embora há muito tempo e deixaram em seu lugar, nas escuras águas da Baía de Guanabara, personagens mais exóticos, como pneus de carro e garrafas de refrigerante.
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