O bairro de Campo Grande tem suas origens no século XVI, logo após a fundação do Rio de Janeiro, em 1º de março de 1565, por Estácio de Sá. Nos anos e décadas seguintes, a ocupação do solo foi feita a partir da distribuição das sesmarias, que eram grandes porções de terras distribuídas a quem o Reino de Portugal achava que merecesse, principalmente os que lutaram contra franceses e índios tupinambás na conquista e fundação da cidade. Essas sesmarias, se não fossem ocupadas e desenvolvidas, eram devolvidas, as chamadas "terras devolutas". Muitas se desenvolveram, entre elas as que deram origem à imponente Fazenda de Santa Cruz, origem deste importante bairro da zona oeste.
11.23.2021
AS ORIGENS DE CAMPO GRANDE
10.18.2021
A PONTE DOS JESUÍTAS
Construída em 1752, a Ponte dos Jesuítas é um dos mais importantes e bem preservados símbolos da arquitetura colonial do Rio de Janeiro. Também conhecida como Ponte do Guandu, ela não é uma ponte comum, e sim um ponte-comporta, já que através dos seus arcos era usada para regular a passagem das águas do Rio Guandu, que hoje não passam mais por ali, e também desviá-las para o Rio Itaguaí através de um canal artificial. Com 50 metros de extensão e seis de largura, ela também servia como passagem dos tropeiros que circulavam pelo "sertão carioca", levando mantimentos e outros produtos pelas muitas fazendas da região.
Seu piso é formado por sólidas lajes, no calçamento conhecido como pé de moleque, muito usado em Paraty e o terror dos saltos altos das mulheres. Os quatro arcos, revestidos internamente com pedra, eram chamados de "óculos", e os padres, por meio de comportas de madeira, controlavam a água para evitar enchentes que destruíam as plantações, matavam o rebanho e inundavam as casas. Feita de cantaria e construída na administração do padre Pedro Fernandes, grande empreendedor da fazenda, a ponte é ornamentada por oito colunas de granito com capitéis (parte superior de uma coluna ou pilastra) em forma de pinhas portuguesas. Na parte central, entre belas esculturas barrocas, há um bloco em mármore lioz, onde se vê um brasão com o símbolo da Companhia de Jesus (IHS) e a data de 1752, além da seguinte inscrição em latim:
Flecte genu, tanto sub nomine, flecte viator
Hic etiam reflua flectitur amnis agua
Que, traduzida para o português, diz o seguinte:
Dobra o joelho sob tão grande nome, viajante
Aqui também se dobra o rio oem água refluente
A ponte fez parte do amplo trabalho dos jesuítas de controle das águas, drenagem e irrigação da ampla área da Fazenda de Santa Cruz, repleta de pântanos e terrenos alagadiços em geral, sempre sujeitos a inundações. Dois padres foram mandados para estudar na Holanda, que enfrentava os mesmos problemas, para aprender os procedimentos corretos. Foram feitos mapas hidrográficos por toda a região, e os vales, morros e elevações em geral, foram estudados. Os jesuítas concluíram que os leitos dos rios deveriam ser contidos nos pontos de inundação, com as pontes-comportas, aberturas de valas e canais para o escoamento das águas, solucionando o problema de enchentes e secas e tornando a Fazenda de Santa Cruz uma das mais produtivas do Brasil.
Com a canalização do Guandu, cujas águas abastecem a população da cidade, a ponte perdeu sua função original, mantendo, no entanto, a importância histórica e arquitetônica, tanto que seu tombamento foi um dos primeiros do país, em 1938, quando o governo de Getúlio Vargas criou a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, hoje o mais instituto de preservação do patrimônio, o Iphan (só mudando o "diretoria" para "instituto"). Infelizmente a ponte sofreu degradação de pessoas que retiraram partes de sua estrutura para algum tipo de obra, inclusive com a derrubada de duas colunas, mas os constantes trabalhos de recuperação (principalmente os de 2007, feitos pela prefeitura do Rio de Janeiro) e a conscientização da população local estão dando a este importante monumento da cidade o seu real valor. A Ponte dos Jesuítas fica na Estrada do Curtume.
- Fotos tiradas por Ronaldo Morais em 1984. Hoje a ponte está bem conservada.
10.11.2021
RIOS ANTIGOS

9.27.2021
CONSTRUÇÃO CARTOGRÁFICA EM SANTA CRUZ
Apresentação do projeto de Construção Cartográfica em Santa Cruz, um belo trabalho para o qual fui convidado a participar, organizado pela jornalista Juliana Braga e com jovens do bairro, que fizeram um mapeamento histórico e afetivo de Santa Cruz. Em breve o vídeo do projeto vai ser disponibilizado e haverá também uma exposição com as fotografias tiradas pelo jovens. O lançamento ocorreu hoje de manhã no Noph, Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa Cruz, no Palacete Princesa Isabel. O Noph é coordenado pelo historiador Bruno Cruz.
SINOS, INCÊNDIOS E BALEIAS
Numa cidade cheia de sirenes e motores, é preciso fazer um grande esforço para se pensar na tranquilidade que devia ser quando estes e outros ruídos ainda não existiam. No centro do Rio de Janeiro, como havia, e ainda há, muitas igrejas, o auxílio dos sinos era fundamental. Eram eles que indicavam aos bombeiros o lugar exato do fogo, além de casamentos, enterros e outros eventos importantes. E indicavam também, como no caso do temido "toque do Aragão", a hora de se recolher.
9.20.2021
LEITE COM MANGA
Uma das atitudes mais corajosas que já tomei na vida foi quando pedi um copo de leite com manga numa agradável tarde de sábado em um bar do subúrbio carioca de Cascadura. Não que as condições do estabelecimento fossem inadequadas, era até simpático o bar, mas o ato de coragem se justifica por eu ter ouvido desde pequeno que a mistura de leite com manga poderia levar à morte em poucos minutos.
9.08.2021
O FRANCÊS QUE SAQUEOU O RIO
Se o francês Jean François Du Clerc, com cerca de mil corsários, não conseguiu conquistar o Rio de Janeiro, em 11 de setembro de 1710, e ainda acabaria assassinado na prisão, um ano depois a situação seria bem diferente. Outro corsário francês, René Duguay-Trouin, chegava à cidade com 17 navios (na verdade foram 18, pois no caminho os franceses obrigaram a tripulação de um navio inglês a seguir com eles) e cerca de 4 mil corsários. Duguay-Trouin rompeu as defesas da Baía de Guanabara e invadiu o Rio, apoiado por uma forte neblina, no dia 12 de setembro de 1711, há 310 anos.
8.24.2021
O ADVOGADO DOS INCONFIDENTES
Um importante personagem da Inconfidência Mineira nasceu no Rio de Janeiro, em 1752. José de Oliveira Fagundes era filho do comandante José Ferreira Lisboa e de Firmina Inácia de Oliveira. Aos 20 anos, foi estudar Direito em Coimbra, tendo concluído o curso em 1778. Trabalhou em Lisboa e depois voltou ao Rio de Janeiro, exercendo a profissão em varas cíveis e criminais. No dia 31 de outubro de 1791 foi nomeado, pela Alçada, advogado da Santa Casa de Misericórdia para defender os réus da Inconfidência Mineira, prestando juramento nessa data. As duas devassas já estavam reunidas numa só. Sua admissão na Santa Casa ocorreu em 1790 e ele ganharia 200 mil réis pelo serviço.
7.17.2021
O NOSSO 11 DE SETEMBRO
A data de 11 de setembro costuma ser lembrada por dois acontecimentos dramáticos de alcance mundial: o ataque às torres gêmeas, em Nova York, em 2001, e o golpe militar no Chile, em 1973.
6.23.2021
CURSO DE HISTÓRIA DA ZONA OESTE CARIOCA
O Curso Livre de História da Zona Oeste Carioca será ministrado pelo jornalista e escritor André Luis Mansur de forma on-line e ao vivo, em quatro aulas, terças, das 19h às 21h, abrangendo a região entre Deodoro e Sepetiba. Os alunos vão lidar com temas importantes do passado da região, como a Fazenda de Santa Cruz, a Fábrica Bangu, a invasão de corsários franceses em Guaratiba, além de personagens importantes, como Freire Alemão e Padre Miguel, entre muitos outros assuntos.
6.22.2021
A CASA DA INFÂNCIA
Portão do número 84 da rua Sirici, em Marechal Hermes, onde morei, e fui muito feliz, de 1969, quando nasci, até 1990, quando me mudei para Campo Grande. É uma vila de 6 casas e morávamos no número 6.- em cima tem mais 2 apartamentos. Fica bem pertinho do Largo de Marechal e da Estação de Trem.
5.20.2021
NOMES DE BAIRROS CARIOCAS E SUAS LENDAS
NOMES DE BAIRROS CARIOCAS E SUAS LENDAS, ALGUMAS ATÉ BEM CONVINCENTES
Por André Luis Mansur
Nomes de bairros sempre despertam
curiosidades. E o mais interessante é que, ao lado da versão, digamos, oficial,
há sempre a lenda, a explicação mais folclórica, que ficou na tradição oral
durante décadas, às vezes séculos, e muitas vezes são as mais interessantes. É
o que acontece com o nome da Ilha de Guaratiba e de outros bairros aqui da Zona
Oeste do Rio de Janeiro.
Quando comecei a conhecer a região, lá pelos anos 80, estava em Campo Grande e vi um ônibus com o destino "Ilha". Meu primeiro pensamento foi que seguia para a Ilha do Governador. Mas depois vim a descobrir que não havia, e não há até hoje, um ônibus direto entre Campo Grande e Ilha do Governador. Que ilha era essa então? Aí me explicaram que era a Ilha de Guaratiba. Ah, tudo bem, Guaratiba tem um amplo litoral, deve ser alguma das ilhas que estão ali por perto. Mas que nada. A Ilha de Guaratiba fica é em terra mesmo, foi o que me disseram, e seu nome tinha a ver com um tal inglês que morou lá fazia muito tempo. Um tal de William.
Reza a lenda, e aí vem a versão folclórica, que um inglês chamado William, que teria vindo com a Corte portuguesa, em 1808, foi morar em Guaratiba e aí, quando as pessoas iam para lá, diziam: "Vai aonde? - Para a fazenda do seu William. - Que William? - O William de Guaratiba". E aí o tal William de Guaratiba, com o tempo, e bota tempo nisso, foi mudando até chegar ao nome atual de Ilha de Guaratiba.
Bem, como eu disse, esta é a versão
folclórica. A outra explicação diz que o nome Engenho da Ilha já existia bem
antes da chegada da Família Real e não tem nada a ver com inglês nenhum, e sim
com a grande quantidade de rios e canais da região, que, quando enchiam (e
lembremos que os rios tinham muito mais água do que hoje), deixavam uma grande
porção de terra, mais elevada, cercada de água por todos os lados, a tal Ilha
de Guaratiba. Como não sou dono da verdade, nem pretendo ser, deixo para cada
um escolher a sua versão - eu escolho esta última.
Fachada da sede do Ilha Futebol Clube
Brasão de Realengo
Inhoaíba - Instituto Ana Gonzaga
Também o bairro de Vila Valqueire, já ali entre as Zonas Norte e Oeste, possui uma explicação bem curiosa sobre o seu nome, a de que teria existido uma fazenda em um tal "V Alqueire" ("V" é "cinco" em algarismo romano, seria um "quinto alqueire"), mas neste caso não há dúvida, o nome vem mesmo do fazendeiro Antônio Fernandes Valqueire, dono de um engenho na região no século XVIII. Mesmo assim há quem acredite no tal "quinto alqueire".
Rua das Verbenas, na Vila Valqueire, década de 30
Dúvidas à parte, esta e outras versões sobre os nomes de vários bairros da cidade sobreviveram até hoje, mostrando a força da tradição oral, que se muitas vezes está distante da verdade registrada em documentos oficiais, ela não deixa de ter o seu valor ao despertar a curiosidade dos moradores pela origem dos nomes dos seus bairros. Como já falei aqui neste espaço, conhecer a História do seu bairro é fundamental para se criar afinidade com ele e saber o que reivindicar em melhorias e investimentos. E saber a origem do nome do bairro, da rua ou do logradouro, é o primeiro passo para isso. Afinal, quem não fica curioso ao ouvir falar em nomes como Curral Falso, Manguariba, Marapicu, Paciência, Viaduto dos Cabritos, Buraco do Faim, Esquina do Pecado, Marco 7, Caminho do Vai e Vem e tantos outros que enriquecem a História, "oficial" ou não, da Zona Oeste do Rio de Janeiro.
* Este texto faz parte do meu livro "Crônicas Históricas da Zona Oeste Carioca"
5.02.2021
CENTRO DO RIO
Por André Luis Mansur
Apesar de ter sido criado em Marechal Hermes, nasci no Centro do Rio, na Avenida Henrique Valadares, lá no distante ano de 1969. Vim ao mundo no Hospital do Iaserj, na época Iaseg, hospital que muito mais tarde Sérgio Cabral mandaria demolir.
Passaria a frequentar o Centro do Rio só a partir dos 15 anos, levado por meu saudoso pai, Wilson Baptista, e lembro que o primeiro lugar por onde andamos foi a Avenida Marechal Floriano, que se tornaria um dos meus espaços preferidos por lá. A avenida de prédios históricos, como o Colégio Pedro II, o Palácio do Itamaraty, a Igreja de Santa Rita e a sede da Light, que hoje é um Centro Cultural.
Mas a Marechal Floriano também é a Avenida da Livraria Elizart, que está resistindo bravamente à pandemia e ao esvaziamento do Centro, assim como a Folha Seca, do Rodrigo Ferrari (funcionando em horário reduzido, de segunda a sexta, das 11h às 16h); da Leonardo da Vinci, do Daniel Louzada; da Blooks, da Elisa Ventura; da Travessa; da Casa da Árvore e dos muitos sebos, lugares que eu passaria a frequentar com assiduidade, incluindo aí o mais recente deles, o Sebo X, na Praça Tiradentes, do Jocemar Barros e do Paulo-Roberto Andel.
Todos resistindo e acreditando no renascimento do Centro, que teve boa parte das lojas falidas com a pandemia e também boa parte dos escritórios trabalhando em home-office - muitos escritórios, aliás, vão continuar assim, pois seus gestores perceberam que fica bem mais barato do que pagar os caros aluguéis e condomínios da região.
Rua Primeiro de Março
Mas a recuperação do Centro do Rio (após a pandemia, é claro) vai precisar passar por uma volta às origens, à época em que a região abrigava não só trabalhadores, como hoje, mas também moradores, que se espalharam por suas ruas abertas em meio a pântanos e gangues desde seus primórdios, após ocuparem o Morro do Castelo, em 1567. A Reforma Passos, no início do século XX, afastou os moradores da região central da cidade, mas agora eles precisam voltar, é a única saída para revitalizar de novo a região.
Vai ser difícil, sem dúvida. Mas acredito que aquela região, que derrotou o corsário Du Clerc, em 1710, mas seria derrotada e saqueada pelo corsário Rene Duguay-Trouin, no ano seguinte, entre tantos conflitos e perrengues ao longo de sua História, vai dar a volta por cima. A força do Centro do Rio está na sua mistura, lá se encontram moradores dos subúrbios, da Zona Sul, da Baixada, de outras cidades e estados, uma dinâmica que não se encontra em nenhuma outra parte da cidade e que, acredito, é o que vai fazer a região se reinventar. Mas, como eu disse, vai ser difícil. O cenário atual é triste, mas que possamos ter (talvez no ano que vem, quem sabe?), uma cena parecida como esta da foto que abre o texto, quando lancei meu romance "A Praça" na Folha Seca, um pouco antes do Carnaval de 2019, um domingo de muito sol, samba e aglomeração.