9.26.2009

TV ZONA OESTE - CAMPO GRANDE - RIO DE JANEIRO

Quem puder, dê uma olhadinha nesta entrevista que dei sobre o meu livro "O Velho Oeste Carioca" para a TV Zona Oeste. Abraços a todos.

http://www.tvzo.com.br/videos/andremansur/index.htm

9.21.2009

OS ÓRFÃOS DE BIBLIOTECA



Sempre eleito, e com justiça, o melhor do Rio de Janeiro, o Centro Cultural Banco do Brasil, também conhecido como CCBB, completa 20 anos de atividades ininterruptas agora em outubro. Confesso que o frequento desde o primeiro mês e os motivos são estes: conforto, segurança, programação e preço (quando há). O prédio da rua 1º de Março, 66, no centro da cidade, foi construído no início do século XX e abriga salas de exposição, de vídeo, cinema, teatro, livraria, restaurante e uma biblioteca, tema deste texto. A programação, renovada mensalmente, é de ótima qualidade, as exposições e a sala de vídeo são gratuitas, o ingresso do cinema custa seis reais e o do teatro dez. Além disso, há sempre eventos importantes, como o Anima Mundi, e todos os dias são realizadas visitas escolares com auxílio de monitores atenciosos e bem-informados sobre os eventos.

A biblioteca do CCBB é uma jóia rara (jóia com acento mesmo, pois jóia sem acento para mim parece falsificada). Ninguém te perturba quando você entra, não pedem documentos, não tem crachá, você mesmo manuseia os livros, aliás, uma infinidade deles e dos mais variados assuntos, sem contar as dezenas de revistas, semanais, mensais, bimestrais etc. A sala de leitura é ampla e confortável, com vista para a Baía de Guanabara, (que de longe, sem o odor característico, é belíssima) as poltronas são confortáveis e as mesas grandes, tanto que muita gente vai só para tirar um cochilo, às vezes em cima de um livro mais volumoso como travesseiro. O silêncio é total, os banheiros são limpíssimos e os funcionários educados e, assim como os monitores, atenciosos.

Pois não é que há duas semanas, ao adentrar o elevador que é uma verdadeira obra de arte e pedir à ascensorista “quinto andar, por favor”, como faço há 20 anos, ela me diz, de forma calma e pausada: “A biblioteca está fechada para obras”. Alguns segundo depois, digeri, ainda meio atônito, a informação e percebi o que ela me dizia: faltando um mês para o aniversário de 20 anos do CCBB, a biblioteca, um lugar visitado por milhares de pessoas todo mês, fecharia para obras. Depois do baque, tive que arrumar outro lugar para botar a mochila e dei umas voltas pela Praça XV, num sol ameno de inverno, até chegar às barcas. Fiquei olhando a Baía, desta vez mais de perto e, de tão atordoado que estava, nem percebi o odor característico. Foi aí que entendi o que era um órfão de biblioteca.

Para quem é apaixonado por livros, a biblioteca é como se fosse um santuário, um espaço místico onde você vai compartilhar o seu gosto com pessoas afins. Quem é muito religioso precisa ir ao templo, estar com os que comungam da mesma fé, até para a direcionarem melhor e também para resolverem problemas práticos do grupo. Entre os leitores é a mesma coisa. Ler em casa sozinho é muito bom, não resta dúvida, mas ir a uma biblioteca gera uma sensação de irmandade, pois muitas vezes você está em casa mas os vizinhos começam uma discussão, os carros lá fora passam roncando o motor (isso quando não é o da pamonha), alguém liga uma televisão ou o rádio, enfim, os ruídos em volta não comungam do seu prazer, do seu gosto.

Na biblioteca não. Mesmo que alguns cochilem e ronquem um pouco, mesmo que um celular toque de vez em quando, que alguns leiam apenas por prazer e outros por obrigação, todos ali obecedem à mesma fé, digamos assim. E a companhia dos livros, milhares deles, de autores que já se foram desta vida, mas que permanecem ali, como uma vingança da arte contra a morte (queria lembrar de quem é esta frase), nos dão uma sensação de segurança e tranquilidade que outro lugar não oferece.

A biblioteca é o espaço democrático por excelência, ninguém te discrimina ou te impede de entrar por não estar com ´a roupa ou o penteado´ inadequado. Até quem não tem onde morar pode chegar lá, compartilhar do ar-condicionado, beber uma água gelada e se manter informado pelas revistas. Quando estou numa biblioteca e percebo o fascínio que a leitura é capaz de provocar é que tenho a certeza absoluta de que o Brasil só dará um salto na educação quando os estudantes adquirirem o vício da leitura, o único vício saudável que conheço, e cada lugar tiver uma minibiblioteca, que seja de 20 livros, mas disponível a qualquer um, que seja numa loja de ferragens, mas que o sujeito acabe instigado a ler alguma coisa enquanto o mecânico faz o alinhamento do carro.

Já que falei tanto em fé, felizmente acredito que as orações dos órfãos do CCBB foram ouvidas e a direção do Centro Cultural resolveu, quando já havia, inclusive, terminado este texto, adiar o fechamento da biblioteca para 2010. Uma notícia e tanto, principalmente para quem estava com pesquisas em andamento, mas sem dúvida uma decisão das mais corretas para o próprio CCBB, que hoje também existe em São Paulo e em Brasília e não deveria comemorar seu aniversário com um de seus espaços mais privilegiados fechado.