2.02.2009

(Publicado no caderno "Prosa & Verso", do jornal "O Globo", em dois de fevereiro de 2009, versão online (www.oglobo.com.br/blogs/prosa)

Por Miguel Conde

André Mansur e as histórias da Zona Oeste carioca

O título do novo livro do jornalista André Luis Mansur, "O Velho Oeste carioca" (Ibis Libris), sugere à primeira vista mais um relato sobre o bangue-bangue diário em que a vida no Rio de Janeiro às vezes parece transformada. Não é nada disso, explica o autor. O livro conta uma história menos sangrenta, mas à qual não falta dramaticidade: o desenvolvimento da Zona Oeste do Rio de Janeiro. A partir de relatos da época e trabalhos de historiadores, Mansur conta uma história que a maioria dos cariocas desconhece, e que ajuda a entender um tanto da cidade atual.

Nos comentários sobre a última eleição municipal, houve quem apontasse um antagonismo entre Zona Sul e Zona Oeste. O que você acha disso?

Acho que existe um antagonismo principalmente cultural. Na zona sul, você esbarra em teatros, cinemas, museus e centros culturais, enquanto na parte da zona oeste que estudo no livro (de Deodoro a Sepetiba) não há sequer uma livraria de peso. Em relação à memória da região, tema do meu livro, destaco uma instituição que faz um trabalho muito importante, que é o Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica (Noph), de Santa Cruz.


Na verdade, quando pensei no título, pensei principalmente na sonoridade dele e na curiosidade que poderia despertar, características que me foram confirmadas por muita gente que se sentiu atraída pelo título. No caso da “terra sem lei”, há alguns trechos que falo disso em relação aos problemas de limites e demarcação de algumas das antigas fazendas, que muitas vezes deram origem a conflitos.

O desenvolvimento urbano do Centro e da Zona Sul é razoavelmente conhecido, mas o da Zona Oeste não. Como ele se deu?

Com exceção da Fábrica de Tecidos Bangu, foi basicamente um desenvolvimento agropastoril, com destaque para a Fazenda de Santa Cruz - uma das maiores do Brasil na época em que foi dos jesuítas e chamada de “jóia da Coroa” -, muitos engenhos e o ciclo da laranja, que fez de Campo Grande o maior produtor da fruta nos anos 30 e 40 do século passado. A exceção deste contexto foi a área entre Realengo e a Vila Militar, que, por opção estratégica, foi ocupada principalmente por quartéis do Exército.

Como estudar a história da Zona Oeste nos ajuda a entender o atual estado da região, e em particular seus problemas?

Um dos grandes problemas da Zona Oeste é que ela passou de uma área rural para uma área urbana muito rapidamente nas últimas décadas. Não houve uma fase intermediária, uma fase sub-urbana. Com isso, surgiram diversos problemas, como crescimento populacional desordenado, trânsito caótico e diversas questões de “ordem pública”, para usar uma expressão que está na moda, como poluição sonora, por exemplo. Isso sem contar a degradação ambiental verificada nos parques florestais e no litoral, principalmente em Sepetiba e na Pedra de Guaratiba.

Quais foram os principais autores que registraram algo sobre a vida na Zona Oeste nos séculos anteriores?

Além de autores importantes da região, como o historiador Benedicto Freitas, que escreveu uma coleção de três volumes sobre Santa Cruz, cito autores que dedicaram um bom espaço à região em livros sobre o Rio de Janeiro, como Brasil Gerson, Noronha Santos e Monsenhor Pizarro, sem contar os muitos visitantes europeus que estiveram na região, como a inglesa Maria Graham e o pintor francês Jean Baptiste Debret.

Durante sua pesquisa, o que te surpreendeu sobre a região?

Sem dúvida, foi a história da Fazenda de Santa Cruz, principalmente do período a partir da chegada do príncipe-regente D. João, em 1808, que se apaixonou pela região e transformou o prédio principal da fazenda em palácio de veraneio. Saber que um bairro da zona oeste se tornava sede de um poderoso império durante vários meses do ano realmente me surpreendeu. E a excelente condição da sede da fazenda (hoje é a sede do Batalhão de Engenharia Militar Villagran Cabrita), sempre recebendo visitas de pesquisadores e alunos de escolas públicas, é uma referência perfeita de como pode e deve ser preservado o imenso patrimônio histórico da região.

3 comentários:

Bruna Mitrano disse...

Eu recebi o e-mail e li.
Muito legal, André! Tua obra tá badaladérrima, hein! Do velho oeste carioca para o mundo!

Anônimo disse...

A divulgação e a distribuição estão indo muito bem. Se não o mundo, pelo menos o Rio de Janeiro (rs).

Beijos.

Cris Artes disse...

Gostei muito do seu blog,gostaria de saber mais sobre o "Ciclo da laranja" em Campo Grande -RJ.Onde poderia encontrar fotos e informações mais detalhadas?Estou pesquisando o assunto.Obrigado