9.20.2019

TRECHO DO MEU ROMANCE A PRAÇA


Na praça, há uma regra bem clara: nenhuma prostituta rouba o cliente da outra. Quando isso acontece, geralmente dá briga. E briga feia. Na última delas, Solange, mais conhecida como Sol, uma veterana de mais de 20 anos na área, com pequenas passagens pela Praça Mauá e Vila Mimosa, tomou o cliente de Dayse, uma jovem de 19 anos que estava há dois meses na praça. Incentivada por algumas mulheres que não gostavam de Sol, Dayse resolveu reagir. E da forma mais atabalhoada possível. Simplesmente esperou Sol chegar e se atracou com ela no bar do Hotel Paris, na esquina da Avenida Passos. O dono, o espanhol Ramirez, a tudo observou, limitando-se a afastar as garrafas vazias de cerveja para evitar prejuízo. Uma delas, no entanto, por distração, ficou no balcão e Solange, acostumada a brigas na praça, pegou a garrafa, bateu com ela no balcão até quebrar e já se preparava para rasgar o rosto de traços ainda adolescentes de Dayse, quando as mulheres em volta e também alguns fregueses conseguiram contê-la.



            Dayse ficou com medo e achou melhor sair da praça. Um dos clientes do bar a levou ao Cine Íris, na Rua da Carioca, onde ela agora faz dois shows de striptease por dia e sempre um ou dois programas à noite.
            Os clientes de Leila já eram fiéis a ela, que tinha boas relações com os donos de bares, taxistas, policiais que circulavam por lá e também com os donos de hotel. Embora boa parte das prostitutas da praça cheirasse, os únicos vícios de Leila eram o cigarro e o chiclete, que ela só abandonava na hora do programa, e às vezes nem isso.
            No instante em que Vera Lúcia e Stella estavam com Luiz Antônio na praça, Leila estava com um desses clientes fiéis, conhecido como Zezé da Vaca. Zezé gosta de cheirar. Tanto que quando Leila saiu do banho, as fileiras já estavam prontas na mesa. O quarto é o mais caro, com banheiro e teto espelhado, mas mesmo assim fede um pouco e os lençóis apresentam uma umidade que parece eterna, igual à dos outros quartos. Depois que Zezé cheira, eles transam de forma apressada e tensa, ele por cima dela e bufando muito. Depois ele cheira mais um pouco e pede desculpas pela forma como tudo aconteceu, disse que está com problemas em casa, toma um banho e paga em dobro, como sempre faz. Leila não se mete na vida dos clientes, só se eles insistirem muito. Embora muitos ali queiram desabafar, ela não quer misturar as coisas. Ali é um trabalho para ganhar dinheiro, nada mais. Apenas com Luiz Antônio e seus amigos ela se sente mais à vontade.
            Ela e Zezé da Vaca conversam um pouco, descem as escadas e se separam, com a promessa dele de voltar na semana seguinte. Leila vai para o bar do Freitas encontrar Luiz Antônio e os amigos dele.

* Ilustração de Fernando Krieger.




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