7.08.2008

OS POLEMISTAS GRATUITOS (ou a arte de falar m...)


As farpas lançadas pelo escritor colombiano naturalizado mexicano Fernando Vallejo na última Flip, quando disse que Ingrid Betancourt buscou seu seqüestro e que preferiria que “aquela mulher horrível continuasse presa”, provocou grande polêmica. Mas, se analisarmos friamente, esta declaração faz parte, sem dúvida alguma, do universo dos polemistas gratuitos.

Os polemistas gratuitos são espaçosos. Pode ser um evento pequeno, com apenas dez pessoas, incluindo o palestrante. Mesmo assim o polemista gratuito precisa estar onipresente e onisciente. Ou seja, não deixa de ser um egoísta, pois não quer deixar ninguém falar algo que preste. Ele quer que apenas a sua voz, a opinião ressoe como a verdade fundamental.

Muitas vezes o polemista gratuito acaba até se tornando necessário. Isso acontece em eventos chatos, onde todos assumem posições politicamente corretas em excesso, o que é péssimo para a imprensa, pois não sobra nenhuma manchete interessante. O problema é que o polemista gratuito, depois de soltar suas bravatas e garantir as manchetes dos jornais, acaba se tornando mais um chato, pois uma de suas principais características é não saber a hora de parar no auge e despejar sem limites o seu rancor e a sua rabugice até que todos se cansem e se afastem dele.

Geralmente o polemista gratuito gosta de provocar escândalo quando está perto de lançar um disco, um livro, perto de estrear um show, ou quando se sente em posição secundária durante algum evento. Suas opiniões são dadas de forma estudada, procurando sempre atingir um tema que mexa com a emoção popular e, de preferência, que cause algum tipo de raiva ou rancor. E aí, quando alguém for perguntar quem é o autor de tal livro, por exemplo, o vendedor, ou quem estiver por perto, vai poder dizer: “Ah, é aquele cara que meteu o malho em fulano de tal. Não lembra?” É a glória do reconhecimento para o polemista gratuito.

Quando dois polemistas gratuitos estão presentes ao mesmo evento, raramente eles juntam forças. Vaidoso por natureza, ele quer todas as glórias para si, quer ser o causador da ´grande polêmica´, aquela que vai sair com a foto em destaque no jornal, geralmente em poses bastante típicas, como a do queixo apoiado na mão, a leitura de um livro ao lado de uma janela, ou uma baforada de cigarro (ou charuto) acompanhada de um olhar contemplativo para o teto.

O polemista gratuito, no entanto, precisa tomar cuidado para que a sua tentativa de chamar a atenção não caia na banalidade, senão onde ele aparecer vai ter sempre alguém falando: “Ih, lá vem aquele cara falar m...”. Nestes casos, o polemista gratuito já se tornou uma figura bizarra, decadente e incapaz de provocar uma polemicazinha que seja. Vai vagar pelos salões, auditórios e tendas tentando provocar efeito com tiradas pseudo-inteligentes, mas o máximo que vai conseguir serão olhares de desprezo, deboches ou, em casos extremos, a retirada do recinto por seguranças de terno, óculos escuros e fone no ouvido.

- Ilustração de Nássara para o disco de Roberto Paiva e Francisco Egydio que tinha como temática a briga entre Noel Rosa e Wilson Batista.

13 comentários:

Anônimo disse...

Pois é... Fernando Vallejo não está sozinho mesmo nessa função disputada no mercado.. rs. Mas bem que eles podiam ser menos calculistas e mais expontâneos né... que saudade do Roniquito. rs
Excelente texto André! Ao fim consegui enxergar a cena de um "Lobão" da vida sendo retirado por seguranças de algum evento... mas não vamos sacaneá-lo tanto, pois afinal de contas, ele fez a trilha sonora do serrote, lembra? rs
Abraços.

Anônimo disse...

Isso me fez lembrar dos fast thinkers do Pierre Bordieu...

Anônimo disse...

É mesmo, bem lembrado, Felipe. O pior é que o Lobão nem sabe disso (rs).

Abraços e obrigado.

Anônimo disse...

Então.. serrotamos a música dele... o que vai pensar disso? rs
Abraço!

Unknown disse...

Essas criaturas deveriam conhecer esta paráfrase: "Se não puder falar nada que preste, é melhor não dizer nada".
Beijo

Anônimo disse...

Meu polemista predileto é Caetano Veloso! Me divirto com ele...

Bruna Mitrano disse...

Não deu p'ra não lembrar do Lobão mesmo! O Caetano não é tão gratuito, mas tem lá seus momentos em que o ego predomina. Quando a polêmica é entre os dois então...

Gostei muito do seu texto. Os polemistas, uma espécime nada rara..figuras caricatas já. Talvez sejam necessárias, mas sem exagero, né?!

Abraço, André!

Anônimo disse...

Caetano, quando está perto de lançar um disco, sempre dá uma entrevista ´bombástica´. Já é de praxe. Os polemistas acabam tendo um papel importante, provocam, geram controvérsias, debates, enfim, dão uma sacudida no marasmo. O problema realmente é o exagero, pois aí eles caem no descrédito e na banalização da polêmica.

Abraços em todos e obrigado. Os comentários estão realmente num nível muito bom.

Anônimo disse...

Digamos que Caetano é o "Polemista Profissional"; já Lobão é o típico "polemista amador", isso mesmo, com letra minúscula, pois pra ser Polemista, acredito que deva haver o mesmo "crivo" que há para um legítimo Serrote... pois afinal,eles nos divertem, e venhamos e convenhamos, sem eles as coisas podem ficar sem graça alguma... porém há necessidade de um equilíbrio para não banalizar... e outra coisa! vejo que nesse debate sobre polemistas cabe também aquela discussão sobre ética, pois nem tudo que ao olho nú parece anti-ético, nem sempre é. Mas revirando polemistas, o que dizer de Wagner Montes? Esse pra mim é fanfarrão, e "polemista amador", embora saiba muito bem o que está fazendo.. enfim...
Abraços.

Anônimo disse...

Veja como o assunto rende. Daqui a pouco teremos que lançar também o ´Manual do polemista´, ou ´Manual do fanfarrão´, para podermos sistematizar todas estas categorias tão complexas e diferentes.

Anônimo disse...

digamos que essas são "categorias do cotidiano", praticamente um tom acadêmico em assuntos de boteco. rs

Anônimo disse...

opa! o comentário "anônimo" acima é meu. rs

Anônimo disse...

opa! o comentário "anônimo" acima é meu. rs